Diretor-geral da BBC demite-se devido a edição polémica do discurso de Trump no Capitólio

O diretor-geral da BBC e a diretora executiva de notícias da BBC demitiram-se após edição de discurso de Trump que induzia espetadores a crer que ele apelava os seus apoiantes à insurreição.

RTP /
BBC. Diretor-geral demite-se devido a edição polémica do discurso de Trump no Capitólio Henry Nicholls - Reuters

Tim Davie e Deborah Turness renunciaram aos seus cargos, depois do jornal The Telegraph ter comprovado uma edição polémica no programa Panorama que deturpou o discurso de Donald Trump no Capitólio a 6 de janeiro de 2021.

A edição juntava duas partes do discurso, proferidas com uma hora de intervalo, dando a ideia de que eram seguidas e fazendo crer que o presidente norte-americano tinha apelado à insurreição.

No programa, emitido cinco dias antes das eleições de 5 de novembro de 2024, Trump parece dizer aos seus apoiantes que vai marchar com eles até ao Capitólio para "lutar com todas as suas forças". O presidente contestava na altura a eleição de Joe Biden.

Em vez disso, na frase original, Trump afirmou "vamos marchar até ao Capitólio e vamos apoiar os nossos bravos senadores e representantes no Congresso".

A expressão "lutar com todas as forças" referia-se, na verdade, a uma passagem diferente, proferida uma hora depois do primeiro excerto.
Davie agradece "apoio inabalável"

"Esta é uma decisão inteiramente minha, e continuo muito grato ao Presidente e ao Conselho pelo seu apoio inabalável e unânime durante todo o meu mandato, incluindo nos últimos dias", disse Davie em comunicado.

"Tenho refletido sobre as intensas exigências pessoais e profissionais de gerir este cargo ao longo de muitos anos nestes tempos conturbados, além do facto de querer dar ao meu sucessor tempo para ajudar a moldar os planos da Carta que ele irá implementar."

A notícia antecede um esperado pedido de desculpas da estação na segunda-feira, na sequência de preocupações sobre imparcialidade, incluindo a forma como o discurso do Presidente dos EUA, Donald Trump, foi editado no referido episódio do programa Panorama. O Telegraph referiu também que tanto Davie como Samir Shah, o presidente da BBC, foram avisados em maio sobre a manipulação das imagens, sem que tivesse existido uma reação pública às revelações desde então.

Deborah Turness afirmou ter "tomado a difícil decisão de que já não será o meu papel liderar-vos na visão coletiva que todos partilhamos: procurar a verdade sem segundas intenções".

Acrescentou que "a controvérsia em torno do programa Panorama sobre o presidente Trump chegou a um ponto em que está a prejudicar a BBC - uma instituição que adoro".

"A responsabilidade final é minha", disse, acrescentando que apresentou a demissão a Tim Davie no sábado.

"Embora tenham sido cometidos erros, quero deixar absolutamente claro que as recentes alegações de que a BBC News tem um enviesamento institucional são falsas", concluiu.
Reação da Casa Branca

O escândalo rebentou quando o jornal The Daily Telegraph publicou detalhes, bem como informações de um memorando interno da BBC, que foi divulgado, sugerindo que o programa Panorama editou duas partes do discurso de Trump de forma a fazê-lo parecer encorajar explicitamente os protestos no Capitólio em janeiro de 2021. O memorando vazado foi escrito por Michael Prescott, antigo consultor externo independente do comité de normas editoriais da estação. Deixou o cargo em junho.


O autor do memorando manifestava nele preocupação com o documentário "Trump: Uma Segunda Oportunidade?" produzido para a BBC pela produtora independente October Films Ltd, que também foi contactada para comentar o assunto.

No domingo, a secretária da Cultura, Lisa Nandy, afirmou que a questão do Panorama era "muito séria", mas que havia uma série de "alegações muito sérias" feitas contra a estação, "a mais grave das quais é a de que existe um enviesamento sistémico na forma como as questões sensíveis são abordadas na BBC".

Citada pelo The Telegraph, a porta-voz da Casa Branca, Karoline Leavitt, denunciou as imagens como "deliberadamente desonestas", condenando-as como "notícias 100 por cento falsas".

A BBC foi também repreendida a 17 de outubro pelo organismo regulador dos media por "violar as normas de transmissão" em relação a uma reportagem de Gaza em que o narrador principal, uma criança, era filho de um alto funcionário do movimento islamista palestiniano Hamas.
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